quarta-feira, 6 de julho de 2011

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(postado originalmente em 15 de abril de 2010)

Tic-Tac. O relógio apita e seus olhos abrem. Há uma escuridão quase cega. Você se sente grogue e algo parece fazer as batidas do seu coração soarem no fundo de sua mente como gritos altos e incômodos. Há aquele cheiro forte de sangue, suor e medo. Dos três, o último é o pior. Ele invade sua mente e tudo fica ainda mais difícil, enquanto você mal percebe que isso lhe faz dar mais um passo em direção ao inevitável.
Parece fazer dias desde que você aceitou o convite de seu amigo. Um coração partido, vodka barata e adolescentes roubadas de um país subdesenvolvido parece uma ótima combinação, não? Você só não pensou que algumas daquelas meninas possuem a idade da sua filha. Ou apenas não contava com a minha presença. Alguém que não gosta de gente como você. Que não gosta de quase gente nenhuma. Quem é que merece viver, afinal?
Seus músculos parecem estar cheios de nós. Todos perfurados por enormes agulhas invisíveis. Sua cabeça pesa e pende para os lados, o estômago revira de fome e nojo e o cheiro é tão horrível quanto todo o resto. Mas a dor aparenta já ter se tornado algo que faz parte de você, da sua existência. Não é a pior parte. Não é nada comparado ao que acontece em sua mente. Para mim, essa é a parte mais interessante. Não há um homem que não se torne um bebê chorão ao ser atormentado constantemente pelos próprios demônios. Nem os que se julgam os mais fortes, os melhores. Mas essa é apenas a minha humilde opinião.
Seus olhos pesam. A fé que nunca teve é o que lhe faz lutar contra os passos na direção daquele inevitável. Mas você é fraco. Tão fraco que chega a me desapontar, acaba com toda a minha diversão antes que eu possa aproveitá-la. Quando seus olhos voltam a se fechar e você não consegue mais abri-los, sabe que está morrendo. E suas últimas palavras formam um sussurro que me faz rir. Meu último momento de diversão. Como todos os outros, mesmo sabendo a resposta e ignorando o mal que sempre existiu dentro de você; pergunta-se: Por que eu?
E ainda me chamam de assassina. Eu tento levar como um elogio.
Mas não precisa agradecer. Um filho da puta a menos no mundo.
S. L.
da série 'coisas escritas enquanto se espera o ônibus', uma pausa nos textinhos românticos :p
ps: 'S. L.' não significa Sophia Lawrey, mas também é uma personagem rs

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